STJ REAFIRMA EXCLUSÃO DE CRÉDITOS DECORRENTES DE ATOS COOPERATIVOS DO REGIME DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Em recente julgamento do Recurso Especial n.º 2.091.441/SP, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu no sentido de que os créditos oriundos de atos cooperativos, firmados entre cooperativas de crédito e seus associados, não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, nos termos do § 13 do art. 6º da Lei n.º 11.101/2005 (LREF), incluído pela Lei n.º 14.112/2020.
No caso em apreço, sociedades empresárias em processo de recuperação judicial insurgiram-se contra decisão que excluíra do quadro geral de credores os créditos representados por cédulas de crédito bancário emitidas em favor da cooperativa de crédito Sicredi Alta Noroeste/SP. A cooperativa, por sua vez, sustentou que tais operações configuram atos cooperativos, consoante previsto no art. 79 da Lei n.º 5.764/1971, por estarem diretamente vinculadas à consecução de seu objeto social, razão pela qual não estariam sujeitas ao concurso de credores no âmbito da recuperação judicial.
O colegiado entendeu que:
- O ato cooperativo caracteriza-se pela prática de operações entre a cooperativa e seus associados, tendo por finalidade a realização de seus objetivos sociais, sem intuito de lucro;
- A concessão de crédito aos associados, ainda que formalizada por meio de cédulas de crédito bancário, não tem o condão de desnaturar o caráter cooperativo da operação, porquanto inserida no âmbito das atividades típicas desenvolvidas pela cooperativa em conformidade com seu objeto social; e
- A relação jurídica entre cooperativa e associado pauta-se por princípios próprios do direito cooperativo, notadamente a solidariedade e a mútua assistência, afastando-se das regras ordinárias aplicáveis às relações comerciais e financeiras típicas de mercado.
Com base nesses fundamentos, o Tribunal reafirmou o caráter especial da disciplina dos atos cooperativos, cuja proteção jurídica decorre de interpretação sistemática das normas que regem tanto o regime jurídico das cooperativas quanto o da recuperação judicial, conforme jurisprudência já firmada nos julgados REsp 1.435.979/SP e REsp 1.141.219/MG do Superior Tribunal de Justiça.
A decisão em comento levanta importante reflexão, ao evidenciar a tensão existente entre a proteção conferida aos atos cooperativos e os princípios que regem o processo de recuperação judicial.
A exclusão de referidas operações do regime recuperacional contribui, sem dúvida, para a estabilidade institucional do sistema cooperativista, garantindo-lhe autonomia funcional e maior previsibilidade jurídica. Todavia, cumpre ponderar se tal prerrogativa, ainda que respaldada pela lógica e pelos fundamentos do direito cooperativo, não acaba por fragilizar o princípio da paridade entre credores, especialmente em hipóteses que envolvam operações de crédito com relevância econômica.